terça-feira, 4 de agosto de 2009

Afeganistão: cresce produção de papoula com os EUA

ONU denuncia aumento de 50% da produção da droga no país ocupado pelos estadunidenses

Dafne Melo,
da Redação

Desde 2003, a Organização das Nações Unidas (ONU) chama a atenção para um fato curioso: desde a invasão estadunidense no Afeganistão, em outubro de 2001, a produção de papoula - matéria prima de drogas como ópio e heroína - vem crescendo drasticamente. O último relatório da ONU, feito em parceria com o Banco Mundial e divulgado em 28 de novembro, mostra que a produção de 2006 bateu todos os recordes: a área destinada para o cultivo cresceu 59% em relação a 2005, e a safra aumentou em 49%. Os números divulgados pela Casa Branca são diferentes: a produção teria aumentado 26% e a área cultivada crescido 61%.

De acordo com o documento, estima-se que 92% de toda a heroína que circula no mundo é feita com papoula afegã. A droga segue principalmente para o mercado europeu, embora também esteja sendo traficada de forma crescente para os EUA que, tradicionalmente, recebem a droga da Colômbia.

A questão já vem também sendo abordada por alguns jornais estadunidenses, como o Washington Post e o LA Times. Este, em matéria publicada dia 5 de dezembro, mostrou que as Forças Armadas dos EUA no Afeganistão não têm colaborado com as agências antidrogas de seu próprio país. Fontes consultadas pela reportagem do jornal afirmam que o Exército "negam as solicitações de agentes antidrogas [dos EUA] para acompanhar os soldados em suas batidas".


EXPLICAÇÕES

O governo dos EUA atribui ao Talibã a culpa pelo aumento na produção da papoula e diz que é por meio deste comércio que o grupo financia ações terroristas. John Walters, chefe da divisão antidrogas da Casa Branca se disse "desapontado" com os números e afirmou que "as forças rebeldes do Talibã são o maior impedimento na estabilização e reconstrução dos esforços no Afeganistão".

Já a ONU acredita que a maior parte dos ganhos fique com o crime organizado internacional, já que a papoula sai do país e é vendida a um preço relativamente baixo, se comparado com a quantidade de dinheiro que o tráfico de heroína movimenta. Além disso, o relatório atesta que a corrupção dentro do governo afegão - principalmente dentro do Ministério do Interior e da polícia - é um dos principais entraves para o combate ao cultivo da papoula. Em tempo: o atual presidente do país, Hamid Karzai, foi posto pelos EUA no poder em 2001 e foi eleito em 2003, num processo eleitoral acusado de fraudes.

Reportagem do Washington Post publicada no início de dezembro atribui também a Washington uma parcela de culpa. Argumenta que Washington e o governo afegão formaram alianças com chefes tribais anti-Talibã, alguns dos quais são suspeitos de estar profundamente envolvidos com o tráfico.

DENÚNCIAS

Há quem defenda que a parcela de participação da Casa Branca é bem maior. O canadense Michel Chossudovsky, professor de Ciências Econômicas na Universidade de Ottawa, em artigo publicado na página do Centro de Pesquisa sobre a Globalização, entidade onde é diretor, afirma que recuperar a produção da papoula e obter o controle das rotas da heroína fazem parte da agenda estadunidense para a região. "Há negócios e interesses financeiros poderosos por trás do narcotráfico. Assim, o controle geopolítico e militar das rotas de drogas é tão estratégico quanto às de petróleo e seus oleodutos", escreve Chossudovsky, enfatizando que, após o comércio de petróleo e de armas, o de drogas é o que mais movimenta dinheiro no mundo (400 a 500 bilhões de dólares por ano).

O pesquisador relembra que durante os anos de 2000-2001, o regime do Talibã criou um programa de erradicação da produção de papoula altamente bem sucedido. Os esforços, que fizeram a produção cair em 94%, foram inclusive feitos com o apoio da ONU que hoje diz que a ação do Talibã foi apenas para aumentar o preço da droga no mercado. Entretanto, os números mostram que a invasão acabou por revigorar o mercado de ópio, cujo preço, em 2002, ficou 10 vezes maior do que em 2000.

Outro mito contestado por Chossudovsky é de que quem mais se beneficia do tráfico de heroína é o Talibã. A ONU estima que a contribuição desse comércio para a economia afegã está na ordem dos 2,7 bilhões de dólares. Porém, apenas 5% ficam com os fazendeiros e comerciantes afegãos. Fazendo cálculos com base no preço de varejo da heroína, somente da Grã-Bretanha o comércio da droga renderia de 124 a 194 bilhões de dólares.

O pesquisador canadense conta que a ONU também omite a origem da produção de ópio no Afeganistão. Até a invasão do país pela União Soviética (1979-1989), não se produzia papoula. Com o objetivo de desestabilizar a presença soviética, a Agência Central de Inteligência (CIA) dos EUA teve um papel central no desenvolvimento da produção da droga, cujo dinheiro alimentava forças rebeldes. "A economia afegã de narcóticos foi cuidadosamente projetada pela CIA, apoiado pela política externa estadunidense", escreve.

Fonte: www.brasildefato.com.br

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