SÃO PAULO - Em 2004 não existiam YouTube (2005), Twitter (2006), nem iPhone (2007) e o Facebook era uma pequena rede social limitada a universitários americanos. Nas eleições presidenciais de 2008 nos EUA, portanto, havia um mundo de possibilidades a ser explorado e muitas incertezas quanto à real eficácia dessas ferramentas como meios de comunicação. Para construir uma estratégia de internet para a campanha do presidente Barack Obama, Scott Goodstein trabalhou por dois anos, testando todas as opções disponíveis e aprendendo que a força da web está no internauta comum.
Durante sua palestra na Campus Party, nesta quarta-feira, Goodstein citou a grande mudança que vem ocorrendo na forma como as pessoas consomem mídia. Se há dez anos era uma estratégia inteligente colocar anúncios após a previsão do tempo do jornal da noite, hoje em dia isso não basta. Os mais jovens acompanham a meteorologia pela internet. E mesmo o público mais velho, com pouco mais de 30 anos, já é da geração que considera a multitarefa algo trivial - assistimos televisão enquanto navegamos na internet, por exemplo.
- As campanhas não devem evitar, mas sim abraçar essas mudanças - defende ele.
Citando o conceito da "cauda longa", Goodstein salienta que se deve levar em conta que as redes sociais não são veículos de massa como a TV. Não se chega a "todos" os cidadãos de um país através do Facebook, mas é importante atingir grupos especificos construindo as ferramentas e estratégias adequadas. Como teve dois anos para trabalhar, Goodstein pode testar boa parte dessas novas estratégias durante as primárias, quando Obama ainda concorria para ser o candidato democrata a presidência.
Um fator crucial para o sucesso da campanha, segundo ele, foi a integração que havia entre todas as equipes, tanto de mídias mais tradicionais quanto da internet e celulares. O site foi um dos desafios da equipe. O design original era ultrapassado e inadequado - lembrava uma propaganda de TV. Com um redesenho, a equipe procurou dar uma cara mais moderna, chamar atenção para a mensagem principal e integrar as novas formas de participação dos eleitores. A posição dos links para as redes sociais, no entanto, foi uma escolha curiosa para quem tanto apostava nelas.
- Toda a mídia social ficava numa área cinza. Quem conhece internet saberia onde encontrar. Não precisávamos perturbar as pessoas no site, pois já tínhamos essa presença nas próprias redes sociais - explica.
Goodstein conta que a equipe fez muitas experiências durante a campanha, e o uso do Twitter foi uma delas. Quando eles entraram no site, quase ninguem estava lá. Boa parte da repercussão em relação ao Twitter surgiu quando Obama começou a utilizar a ferramenta para passar informações da campanha diretamente para o público. E o microblog é especialmente eficiente para isso graças à sua capacidade de propagação de mensagens, com os usuários repassando "tweets" para todos os seus amigos.
Com o celular a história foi semelhante. Goodstein alerta que as redes sociais servem como ferramentas de convocação, mas a partir daí o controle está nas mãos do internauta. E isso é bom. O SMS, por exemplo, era usado por voluntários que enviavam torpedos para seus amigos e conhecidos avisando sobre onde seria o comício de Obama na cidade, por exemplo. Além de garantir a leitura das mensagens, a iniciativa dava um tom mais pessoal à convocação. Mas claro que a equipe só tinha controle sobre o primeiro grupo que enviava as mensagens.
- A mídia social é importante para garantir que sua base fique todo o tempo engajada, envolvida. A maior parte das pessoas nos EUA sequer vota. Como fazer com que os jovens votem? Se você acompanha seu político no Twitter, vê seus amigos e artistas apoiando, cria uma conexão diferente.
Mas, numa estratégia que coloca tanto no poder nas mãos dos internautas, como escapar de calúnias e tentativas de sabotagem? Para Goodstein, o segredo é não fugir de nada, dar respostas para todas as questões que forem levantadas e garantir que elas apareçam muito bem no Google.
- Sabíamos que Obama seria acusado de coisas específicas, como não ter nascido nos EUA. Para isso tínhamos um site que servia para lutar contra os malucos. Lá falávamos sobre todos os rumores negativos, porque queríamos que as pessoas que buscassem esses rumores chegassem aos fatos. Não nos escondíamos dos boatos; trazíamos para dentro da campanha.
Mas nem todas as experiências foram um sucesso. Quase todo mundo nos EUA já tinha celular em 2008, mas a tentativa de distribuir vídeos pela plataforma não deu certo. Segundo Goodstein, na época o iPhone ainda não tinha a força que tem hoje, e o custo era muito alto. Com isso, as pessoas não tinham com vídeos a mesma prática que já tinham com o envio de torpedos. Mas ele não se arrepende de ter tentado.
- O segredo é não ter medo de experimentar, fazer diferente e testar as ferramentas mais inovadoras.
Segundo o publicitário, o maior mérito de um trabalho desse tipo é permitir que os eleitores se engajem e participem. O vídeo "Yes We Can" é um exemplo prático disso. Goodstein garante que a equipe da campanha nada teve a ver com a produção do vídeo. A música, por exemplo, é de Will.i.am, dos Black Eyed Peas. Apesar de viver disso, ele admite que os publicitários não têm sempre as melhores ideias. E todos nos lembramos da Obamamania que tomou o mundo em 2008, com fotografias dele sendo usadas em camisas, cartazes de festas e todos os tipos de produtos informais.
- Pessoas começaram a mandar imagens e vídeos de animais pedindo votos para Obama. E assim elas mostravam para os amigos em quem iriam votar, engajando todos na campanha.
Em 2010 o Brasil elegerá um novo presidente e, pela primeira vez, terá campanhas pela internet. Goodstein alerta que o segredo não é copiar o que deu certo, uma vez que essas mídias estão mudando o tempo todo, de acordo com a vontade das pessoas. O MySpace, por exemplo, perdeu boa parte da importância que tinha no mundo. O Facebook vem crescendo exponencialmente no Brasil. O Twitter cada vez mais deve ser levado em consideração e sabe-se lá o que pode surgir de novo nos próximos seis meses.
- As pessoas vão usar as redes sociais mesmo que as campanhas não usem. O poder não está nas nossas mãos. Tivemos cerca de dez mil vídeos no canal oficial do Obama, mas uma busca no YouTube mostra centenas de milhares de vídeos. Falei sobre algumas coisas que fizemos. Na campanha pela reeleição, Obama não usará os mesmos instrumentos de 2008.
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