domingo, 17 de outubro de 2010

Manifesto pessoal de um brasileiro preocupado com a nação

Queridas e queridos compatriotas

No fragor deste processo eleitoral, de segundo turno das eleições presidenciais para Presidente/a do Brasil, em 2010, vencendo todo o pudor, venho a público manifestar a grande preocupação que carrego e que não me deixa dormir: o espectro de 1964 que ronda sobre este país.

Só assim posso ler a cena de Aparecida, que é como a ponta de um fio emaranhado que é preciso desembaraçar, para que se possa perceber a situação de perigo iminente por que passa a nação e, com ela, toda a América Latina e suas esperanças de paz, libertação e desenvolvimento humano - social, econômico, político e ambiental.

Se conhecemos a parábola evangélica do fariseu e do publicano, podemos saber de imediato a que figuras nos referimos.

Mas comecemos do princípio, da tática que está muito clara: de que a melhor defesa é o ataque. E, pelos ataques, podemos perceber o que é que se está buscando defender; mais ainda, esconder.

Quem tem alguma coisa a esconder entre os dois candidatos?

Quem enfrentou de peito aberto, com a cara e a coragem, a ditadura militar nos seus períodos mais duros e sangrentos?

Ou quem, temeroso, quando a quartelada mal dava seus primeiros passos, no golpe de 64, precipitou-se como um rato, abandonando o barco, e deixando para trás os patriotas todos na resistência? – e ainda se diz perseguido pela ditadura militar...

Mas o mais curioso estaria por vir. Aonde foi mesmo que foi se refugiar essa triste figura, quando os militares chilenos, apoiados pelo governo americano de então, desfecharam o duro golpe sobre aquele povo irmão?

Todos que conseguiram algum refúgio contra as garras de Pinochet rumaram para a Europa, para o México ou algum país não alinhado aos golpistas e ditadores latino americanos.

E onde foi parar o nosso “herói”? Nada menos que nos Estados Unidos. Foi se refugiar na toca do lobo. Com certeza, achou mais seguro ficar junto àqueles com quem se alinharia em seguida.

Ou, brasileiros inocentes, não sabemos nem suspeitamos das mil artimanhas da C.I.A.?

Pois não foi de lá que voltaria mais tarde ao Brasil, para formar, com subsídio americano, essa curiosa social-democracia “brasileira”? Social-democracia que foi a responsável pela implantação e radicalização das políticas neoliberais no país: a promoção da desregulamentação da legislação do trabalho, da perda dos direitos sociais conquistados com tanta luta, provocando desemprego, achatamento salarial e uma desigualdade social nunca vista antes no país. Foi esta a Social-democracia desses senhores: de alinhamento ao Consenso de Washington e da venda do patrimônio público por uma bagatela, na bacia das almas, aos capitais estrangeiros.

E ainda chamam de “social-democracia”... Só se for “no limite da irresponsabilidade”!

Pois é essa figura que agora quer voltar, apoiado por tudo que tem de pior na política brasileira: a TFP, os Legionários, a Opus Dei, os ruralistas, os quintocentões todos. Todos esses que atuaram nos porões da ditadura, que jamais foram tocados – aqui sim, a verdadeira Caixa de Pandora da nação que, se aberta, as maldades todas virão à tona, avassaladoramente.

Por isso mesmo, para esconder o que não pode mostrar, esse senhor se fantasia como “do bem”: como um devoto romeiro que, à frente no templo, à vista de todos, bate no peito para se mostrar: “não sou como os outros...”

Sepulcros caiados, raça de víboras, a quem é que vocês pensam que podem enganar? Vocês podem enganar muita gente durante muito tempo, certamente. Mas vocês não podem enganar todo mundo durante todo o tempo.

Perguntem ao juiz Flávio Bierrenbach quem é esta triste figura...

Alguém já se perguntou sobre as ligações desse senhor com o Daniel Dantas? Os mesmos procedimentos, mesmos instrumentos, a mesma sociedade...

Como será que eleitores podem confiar em alguém que, ainda como candidato, pega o telefone e dá ordens à Suprema Corte, procurando intervir no judiciário? Imagina o que fará se for eleito?

Como confiar em alguém que tem como sua tropa de choque toda a imprensa falada, escrita e televisiva, a mesma que se fartou durante a ditadura militar e, em seguida, prestou serviços e favores insubstituíveis à implantação e fomento diário à radicalização das políticas ultra-liberalizantes?

Como confiar em quem goza da plena confiança de ruralistas, latifundiários e de todas as elites responsáveis pelo atraso e pela miséria do povo brasileiro?

Como confiar em alguém que pensa o Brasil a partir de São Paulo, que faz guerra fiscal contra os outros estados e se aproveitou do corte do IPI, feito pela União em combate à crise internacional, para aumentar o ICMS do Estado de São Paulo?

Como confiar em quem vê o crédito para as famílias fazerem “puxadinhos”, como uma grande solução para o problema habitacional dos pobres?

Como confiar em um candidato que sequer menciona qualquer palavra sobre a universidade, pois que acha que, para o povo, basta o ensino técnico e alguns cursinhos rápidos apenas? Fazendo da educação uma grande negociata, uma das maiores do século XXI, sob a batuta mercantil do secretário Paulo Renato?

Como confiar nesta triste figura, que quer ver o fim do Mercosul?

Que fez parte de um governo cujo chanceler se submeteu a tirar os sapatos para poder pisar em solo americano do norte?

Que, se tivessem tido tempo de aprovar a ALCA, a Aliança de Livre Comércio das Américas, teriam levado o nosso país - e a América Latina toda junto - à bancarrota e a desgraça?

Que por pouco não chegaram à privatização completa da Petrobras (Petrobrax) e que propõe a entrega do Pré-Sal às petroleiras internacionais?

Que, arquivadores mores da República, só querem mesmo é dar um basta ao processo inédito em curso, de combate à corrupção, via CGU, polícia federal e Ministério Público.

Como confiar nesta figura que esconde qualquer nesga que possa tisnar sua aparência de “boa” figura, apresentando-se como “do bem”, como bem cabe às artes da diabolia, ao pai da mentira, ao enganador?

Esconde a cracolândia paulista; esconde o PCC; esconde a causa dos incêndios nas favelas; esconde os bairros pobres inundados pela abertura de comportas que evitam o alagamento da cidade dos ricos; esconde o favorecimento à imprensa que, fantasiada de isenta, o apóia descaradamente; esconde as brigas e disputas internas de sua corte...

E quem sabe a troco do que, ele consegue manter coesos – o DEM/PFL a gente sabe bem – os cabeçudos do seu partido? Ou ao menos o mineiro, recém eleito senador, que havia dito que deixaria a agremiação: que chantagem o levou a dar apoio ao candidato? Não seria apenas a ameaça de fazer repercutir o entrevero com uma mulher, na saída de uma boate no Rio de Janeiro, não é mesmo! Coisa bem mais grossa deve ter por trás...

E o que diria seu avô, Tancredo Neves? Que não confiava em Fernando Henrique nem como estafeta?

Mas a minha grande preocupação não é tanto com o cinismo e a desfaçatez que grassa especialmente em certos políticos. É, sobretudo, com a miopia de grande parte dos eleitores que parece que emigraram seus votos para este “santinho do pau oco”, essa cobra venenosa travestida de pomba “do bem”, essa hiena em pele de cordeiro, mas que não consegue esconder sua risadinha nervosa. Esse usador e abusador da religião e da boa fé do povo, pescador de águas turvas, biruta de aeroporto, incapaz de esboçar um programa de governo, não porque não tenha programa, mas porque seu programa não é publicável.

Esses que emigraram seus votos parece terem se esquecido de 1964; do Ato Institucional nº 5 de 1968 - os escrúpulos às favas -; dos governos neoliberais de FHC e seus ministros; de quantas vezes FHC teve que recorrer ao FMI; de como, para ele, era “fácil governar”, porque quem governava era o FMI, com arrocho, desemprego e corte dos direitos sociais?

Não é o que estamos assistindo, nesses dias de hoje, na Europa? Pois essa política segue seu curso, mesmo se desmascarada pelo sucesso do modo pelo qual o Brasil saiu da crise. É só o que eles querem ver de volta! Basta olhar as teorias dos três que acabam de ganhar o Prêmio Nobel de Economia: aprofundamento do neoliberalismo impiedoso, agora voltado para cima, ainda mais especialmente, dos trabalhadores.

Então, a qual desses passados cinzentos essa parte do eleitorado está querendo levar de volta este país? Onde está a memória dessas pessoas? Onde a sua leitura da realidade?

Como pode esse monumento ao patriarcalismo, que ataca a sua oponente pelo fato de que, sendo mulher, seria um “poste”, pretender ter algum sucesso?

Pois aí está uma mulher forte: guerreira. Capaz de levar nosso Brasil a fazer, não 50, mas 500 anos em 5 – porque o 5º ano na seqüência de um bom governo, o primeiro do mandato seguinte, é ainda comandado por aquele –porque terá acabado com a submissão e a dependência, terá erradicado a miséria histórica deste país e terá implantado a educação para todos, da creche à pós graduação, o que é um direito de todos.

A hora é de retomar a luta pela redemocratização, pela defesa da instituição democrática e da radicalização da democracia. E não deixar o país voltar ao passado recente, de atraso, submissão e miséria.

Depois do Metalúrgico, a vez agora é da mulher, guerreira e competente. Dilma presidente.

Rio de Janeiro, 13 de outubro de 2010

Xico Lara

Por email.

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